Arzak: O Fantasma de Moebius Ainda Ronda o Deserto

Mundo Gonzo
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Moebius não morreu. Ou melhor, morreu sim, em 2012, com um traço tão limpo que parecia ter sido desenhado direto no éter. Mas como todo gênio maldito, Jean Giraud não soube ficar quieto. Onze anos depois, ele ressuscita com "Arzak: Destination Tassili – Corpus Final", um tomo sagrado publicado pela Moebius Production que é metade testamento, metade visão e totalmente Moebius.

 


O volume é uma espécie de seita encadernada: 248 páginas em francês puro, 24 x 32 cm de papel grosso e silencioso como dunas. Dividido em três partes, ele percorre a trajetória espiritual, criativa e gráfica do personagem Arzak, esse cavaleiro silencioso de um deserto sem lógica.

Página 18

  • 1. "Arzak l’Arpenteur" (revisado): Uma nova versão da HQ lançada em 2010, agora digitalmente restaurada, sem falas, como se Moebius dissesse: "Leiam com os olhos, não com a mente".
  • 2. As páginas póstumas: 29 pranchas inéditas, desenhadas entre 2010 e 2012, com nanquim cru e elegância inacabada. O começo do segundo volume jamais publicado. Um fim interrompido, mas eterno.
  • 3. Os arquivos sagrados: Uma coletânea de esboços, textos manuscritos, aquarelas e anotações pessoais feitas por Moebius, além de comentários de Isabelle Giraud. Um passeio íntimo por sua arquitetura imaginária.

Página 30

A edição foi idealizada como obra de arte. Encadernada com aba francesa, traz 164 páginas coloridas e 84 em preto e branco. O marcador de páginas que acompanha o volume parece um talismã de outro plano. Tudo respira misticismo editorial.

Página 213

Arzak nunca foi um personagem no sentido tradicional. Ele é um totem. Um arquétipo. Um grito mudo atravessando paisagens que não pertencem a nenhuma geografia. Aqui, mais uma vez, ele cavalga sem palavras, como se a ausência de texto fosse a forma mais pura de dizer tudo.

Página 224

A crítica francesa, que já elevava Moebius à condição de patrimônio nacional, recebeu "Destination Tassili" como um acontecimento. Uma "transmissão póstuma do invisível", disse o site Avoir Alire. E é isso mesmo. Moebius está ali. Vivo. Em cada linha que não se fecha. Em cada cor que estoura como um delírio controlado.

Página em preto e branco

É um testamento? Sim. Mas é também um mapa para atravessar o deserto da arte moderna. Um lembrete de que a linguagem visual, em mãos certas, pode ser mais eloquente do que mil roteiros. Como crítica, esta obra não é perfeita, há lacunas, pedaços abruptos, silêncios que gritam, mas tudo isso faz parte da experiência. A obra se dobra sobre si mesma, como se desafiasse o leitor a encontrá-la inteira em sua incompletude.

 

Moebius não nos entrega respostas. Ele nos convida a caminhar. A se perder em dunas gráficas, em horizontes de nanquim. "Destination Tassili" é para ser lido como se atravessa um sonho: com os pés descalços, olhos abertos e nenhuma pressa de acordar.

 

Compre se puder. Leia se ousar. Mas nunca espere compreensão. Moebius não desenhava para explicar. Ele desenhava para libertar.


Ps.: será que alguma editora vai pegar esse material?

 

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