É mais que estratégia. É um gesto simbólico. A maior editora de quadrinhos do Brasil, que por anos empurrou o mercado para o luxo e o colecionismo, agora tenta mirar no leitor perdido. Aquele que ficou pra trás quando o preço passou a brilhar mais que o verniz das capas duras.
Quadrinho é escapismo. É ritual. É encontro de esquina, banca de jornal, fila de mercado. Quando tudo isso virou artigo de grife, a base rachou. E como sei disso? Porque converso com quem vende. Com o pessoal da Metrópolis, com o Júnior da GibiManíacos. Desde a alta dos preços, os mangás ainda vendem, mas perderam o frenesi. O público jovem encolheu. O impulso virou planilha. E o que era coleção virou controle de danos.
Agora, com X-Men, Deadpool e Wolverine liderando esse retorno à cultura de massa, o mercado estremece. Porque não são personagens esquecidos. São três dos nomes mais conhecidos da cultura pop global. São cavalos de batalha. E a Panini sabe disso.
Mas o que realmente me tirou do sério não foi o preço. Foi a miopia dos comentários. Gente dizendo que “vai sair mais caro”, que “48 páginas por 19,90 não compensa”, que “é melhor comprar um mix de 44,90 com seis histórias”. Um raciocínio enlatado, egoísta, que gira em torno do próprio umbigo de colecionador fiel.
Eles não enxergam que isso não é pra eles.
Essa iniciativa é uma tentativa desesperada, mas honesta, de colocar um gibi na mão de quem nunca leu gibi. De furar a bolha. De alcançar o moleque que nunca pisou numa loja especializada. De reapresentar o papel e a tinta como portal de entrada pra imaginação.
Não é a solução. Está longe disso. Mas é uma fagulha. Um teste. Um passo que ninguém teve coragem de dar antes. E enquanto essa galera reclama que “não compensa”, o mercado agoniza. Porque o leitor veterano sozinho não sustenta nada.
Se você não consegue ver que essa aposta é pra trazer gente nova, então talvez o problema nem seja o preço. Talvez o problema seja você.
Não se trata de matar a capa dura. Ela que siga existindo, bela e cara como sempre foi. Mas esse novo movimento precisa acontecer com coragem. Precisa acontecer com qualidade. Não dá pra repetir o erro dos mix inchados ou dos encadernados descuidados. Se é pra reconquistar o leitor popular, é preciso respeitá-lo como tal. E isso inclui papel decente, impressão legível e periodicidade que faça sentido.
É cedo pra saber se vai dar certo. Mas é tarde demais pra não tentar. O gibi precisa voltar a caber no bolso e explodir cabeças. Precisa circular, formar leitor, gerar apego. Porque no final do dia, o que segura um mercado não é o colecionador premium. É o moleque que compra um exemplar no sábado e pede outro no domingo.
Se esse novo plano da Panini der certo, a gente pode estar diante de uma nova era de leitores. Se der errado, ao menos foi uma tentativa de reencontro com o que o quadrinho brasileiro sempre teve de melhor: a vocação pra massa.